A cidade, quase sempre tão sonolenta nos dias comuns, naquele sábado, entretanto, regurgitava de vida. O assunto luz elétrica era comentado por todos. Os vizinhos conversavam por cima das cercas divisórias dos quintais. Nas quitandas, nos botequins e nos armazéns de secos e molhados o assunto era sempre o mesmo. Inúmeras casas, principalmente as das pessoas com maiores recursos financeiros, já estavam com suas instalações concluídas. Pouquíssimas famílias encomendaram lustres para as salas de visitas. A maioria, porém, sem condições financeiras, contentava-se com enfeites coloridos de papel crepom, em forma de arcos, adaptados aos pendentes das lâmpadas.
Meses antes, o trabalho de desembarcar da barcaça os postes de madeira e os rolos de fio era motivo de aglomeração dos curiosos no cais da Prainha. Logo a notícia se espalhava e os comentários tomavam corpo nos bares, nas portas das quitandas, no interior dos armazéns ou nas esquinas das ruas. Muitos ainda tinham dúvida e só acreditavam depois que iam ao local onde o material era empilhado.
- Agora sim, Vila Velha vai crescer.
- Diziam alguns, antevendo o progresso da cidade.
Outros, porém, mais idosos, não viam com bons olhos a chegada da luz elétrica. Receavam que o progresso pudesse atrair pessoas nocivas que colocariam em risco o sossego da cidade.
Assim que os operários fincavam os primeiros postes nas ruas e estendiam os fios sob a orientação de um engenheiro, algumas pessoas, movidas por curiosidade, aproximavam-se dos trabalhadores para ver de perto a execução do serviço e dar palpites quando podiam.
Humildes mulheres arrastavam seus filhos para longe do local em que os fios eram espichados, temerosas de que as crianças fossem vítimas de choques elétricos.
- Não há qualquer perigo. A rede ainda não está ligada a Vitória - informavam os mais esclarecidos.
- Num sei não! Me disseram que é muito perigoso. Além do que, criança não deve ficar perto de gente grande que está trabalhando.
Em Vitória, algumas pessoas espantavam-se ao ver um cabo de aço estendido entre o Morro Forte São João e o alto do Penedo, passando sobre o mar. Não sabiam que era um cabo de sustentação dos fios que levariam a luz para Vila Velha.
Para muitos a luz elétrica não representava novidade, pois haviam tido a oportunidade de ver Vitória iluminada. Vários moradores de Vila Velha trabalhavam na Capital e só à noite retornavam a casa nas lanchas a vapor Carlos Alberto, Luíza e Santa Cruz. faziam o transporte de pessoas e cargas, entre a ilha e o continente. O importante, entretanto, era o conforto que o novo e moderno sistema de iluminação ia proporcionar ao povo.
A inauguração da luz elétrica em Vila Velha deu-se em 30 de julho de 1910.
Fonte:
Autor: Dijairo Gonçalves Lima
Livro: Vila Velha seu passado e sua gente